terça-feira, 15 de outubro de 2013

Uma crônica apaixonada sobre a enchente de 2000 em São Lourenço

Imagem de um vídeo no Youtube de autoria de José Newton de Paiva que mostra a Praça João Lage debaixo d'água

Hoje à noite participando de uma reunião de apresentação de plano de contingência da Defesa Civil em caso de catástrofe como a que ocorreu no ano 2000, subitamente fui arremessado para aquela hora e local e confesso que fiquei com os olhos marejados por lembrar de dias tão difíceis. O antes da enchente, a iminência de chegada das águas e o depois que tudo baixou quando os comerciantes jogavam seus prejuízos nas calçadas da cidade.
Era um cenário de guerra. Sem bombardeio, sem ufanismo de qualquer dos lados. Era apenas uma guerra da natureza contra o ser humano onde a primeira ganhou disparado sem termo de rendição.
Tudo naquela época era complicado. As notícias abafadas (imagina falar que São Lourenço iria decretar Estado de calamidade Pública em plena temporada de verão), a cidade sem remédios, alimentos e combustível. E com o dobro de sua população, pois os hotéis estavam abarrotados de turistas.
Cada um daquela administração municipal, cujo prefeito era o Nega Véia, hoje esquecido e que as pessoas tem vergonha de falar que trabalhou com ele, deu o seu sangue para trazer a cidade ao estado de normalidade. Que foi conseguido uma semana depois que as águas baixaram. Me lembro do então secretário de Serviços Urbanos Toninho Guimarães chorando no portão da garagem da prefeitura quando viu o estado em que a cidade ficou. Esta cena ainda permanece na minha mente até hoje.
Com a cidade inundada a prefeitura foi transferida. Sua sede passou a ser o SAAE da Vila Nova, único lugar onde a equipe do prefeito podia se reunir com segurança. A avenida principal da cidade passou a ser o alto da Vila Nova. A cidade estava dividida em duas: O lado de cá da ponte da estação e o lado de lá. E era o lado de lá, o bairro Nossa Senhora de Lourdes que mais nos preocupava. Havia o desabastecimento de gêneros alimentícios. E a falta de remédios controlados para pressão alta e diabetes era apenas mais um dos detalhes que queimavam nossa cabeça à época. Era necessário montar uma linha de suprimento urgente, mas os barcos da época com motores de 25 HP não conseguiam transpor o rio Verde dada a força de sua correnteza. Foi aí que acionamos a Escola de Sargento das Armas. Duas equipes do Exército vieram com botes e motores de 50 HP. Apenas a equipe do sargento Leovegildo (lembro do nome por que era o mesmo do jogador Junior do Flamengo) conseguia transpor o rio Verde. E me vem uma pessoa no dia de hoje falar que com um motor de 15 HP conseguiu transpor aquela correnteza. Sinto muito, mas conversando com o Mauro da Defesa Civil para reavivar minha memória, isso nunca aconteceu. Até mesmo o Valtair que andava de canoa com varejão não conseguiu atravessar o rio Verde. Ficava pelas imediações, na beirada do então caudaloso rio.
A situação foi sui generis. Nunca aquela equipe da prefeitura que inclusive o Dr. Rogério Mello, coordenador da Defesa Civil na época integrava tinha gerenciado tamanha crise. Nunca tínhamos ouvido falar em NOPRED e AVADAN, documentos necessários para receber ajuda humanitária. E ainda enfrentávamos uma situação de que ninguém tinha dinheiro para nada.
Pois bem. Para abreviar a conversa e os amigos leitores não ficarem cansados. A aproximação com a Defesa Civil do Estado nos deu um grande amigo e cidadão honorário que era o coordenador Estadual, Tenente Coronel James Ferreira. Um grande pai para São Lourenço naqueles momento difíceis. Nega Véia, com seu prestígio político - sim ele tinha isso - conseguiu maquinários de limpeza da COPASA para limpeza e desinfecção da cidade. O desastre foi imenso para o comércio. Até uma linha de crédito do BDMG foi aberto para os comerciantes através da então deputada Maria Elvira que acompanhou uma equipe da CDL para acertar os detalhes da vinda do caminhão para São Lourenço onde os empréstimos seriam liberados com juros módicos, mas os comerciantes precisariam estar em dia com suas contas. Adauto Lúcio, Mara, Dr. Lessa, Major Saraiva que autorizou entrarmos com os rádios da época da prefeitura na rede da Polícia Militar e os policiais militares que enfrentavam a patrulha fluvial, pois pela primeira vez registrávamos saqueadores em comércios na Dom Pedro II. Várias pessoas deram o seu sangue e suor, muitos sem dormir por dias para superar as adversidades.
Me lembro da viagem que eu, o empresário João Vitor Gorgulho, o prefeito de Soledade Jamil Murad e o jornalista Márcio Ramos fizemos a Pouso Alegre. Ficamos parados na Fernão Dias, pois não tinha como passar por causa de inundação. O contato que fiz com então subcomandante do 20º Batalhão de Pouso Alegre, Major Siqueira fez com que helicópteros da Polícia Militar resgatassem da Fernão Dias mais de 15 prefeitos e representantes de municípios que iriam participar de reunião com o Governador Itamar Franco naquela hora. Choro agora como chorei na hora em que assumi a tribuna daquela Unidade Policial Militar e falar que São Lourenço estava um caos.
Desprestigiar as pessoas que não estão mais no poder por puro oportunismo não posso aceitar. Se a cidade de São Lourenço hoje conhece um plano de contingência é porque assim que o Mauro da Defesa Civil assumiu o setor, sentamos eu, ele e o sargento Lúcio (hoje na reserva como tenente da PM) sob supervisão direta do Major Saraiva e do então promovido Chefe de Gabinete Militar Coronel James Ferreira.
Tudo bem que queiram florear as ações que desenvolvem, mas não maltratem os que passaram por aquela crise. Se hoje está tudo bonitinho e arrumadinho tem uma causa. E dei muito do meu sangue assim como meus companheiros da prefeitura na época que atendiam o telefone assim  que fossem chamados. Falar que há uma brecha entre 2000 e 2006, eu posso falar pelo governo Nega Véia que até 2004, a Defesa Civil era estruturada e que foi deixada de sobreaviso para ajudar as vítimas de desastre natural ocorrido em Angra dos Reis no anos de 2003. Tínhamos viaturas, barcos e motor de popa. Estávamos aptos para entrar e intervir em qualquer cenário de desastre natural naquele governo. Aprendemos a duras penas. E fomos os principais responsáveis pelos cursos de Defesa Civil que implantou e espalhou outros órgãos pelas cidades banhadas pelo rio Verde. Me lembro de pelo menos um, na cidade de Itanhandu.  
Na reunião de hoje da Defesa Civil vi o Plano de Contingência do município de São Lourenço. Não vi um representante da CEMIG. Com a dupla alimentação da CEMIG no município hoje, pode-se perfeitamente deixar energizado o bairro Nossa Senhora de Lourdes. Não vi isso no plano. Deve-se deixar de sobreaviso a UBS do bairro seja do Nossa Senhora de Lourdes e/ou Biquinha para estoque de remédios essenciais e insulina. Não vi isso no plano. Não vi a prevenção de deixar um motor de 40 ou 50 HP de sobreaviso para atravessar o rio Verde, que não dá para passar com motor de 15, 20 ou 25 HP. Só com teimosia e com perdas de vidas humanas.
Faço este desabafo hoje, como nunca fiz no blog que eu escrevo. Só para lembrar que existem coisas boas também da administração Nega Véia. Querem esquecer o passado, que esqueçam. Mas não humilhem os que muito trabalharam para sair daquela crise nunca antes atravessada sendo que, nunca houve nada parecido nos anos seguintes. Graças a Deus! Em tempo: A idéia de mobilizar os caminhoneiros foi do Sargento Lúcio. No plano elaborado havia esta prerrogativa. Isso em 2001!
Só peço a gentileza de não interpretarem isso que agora escrevo como propaganda de um governo que já passou. Entendam como respeito àqueles que enquanto lá estavam e em momento de crise deram seu sacrifício para superar o maior de todos os problemas que tivemos em São Lourenço. E já que se falou tanto em "missão" na reunião de hoje da Defesa Civil, posso falar com toda força que a missão  que nos foi confiada naquela época foi dada e cumprida por são-lourencianos valorosos e que não fugiram à sua responsabilidade.                              

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